Entrevista 02

30/07/2012

 

Concedida ao Rodrigo Fonseca no começo do ano:

 

a)    Como surgiu a ideia do quarteto “fantástico-novíssimo” que vocês formaram em relação à produção cinematográfica?

 

As melhores ideias são as mais simples, as que chegam por necessidade, e não por cálculo. Acreditamos que a invenção, quando autêntica, acontece por um profundo contato com a necessidade. Tínhamos necessidade em ver filmes e depois em fazer filmes. O Rilke pergunta ao jovem poeta se existe a possibilidade dele não escrever poesia. A nossa resposta (se fôssemos o poeta) viria num milésimo de segundo: NÃO! Ao mesmo tempo, foi muito natural nos juntarmos pra fazer um filme porque já estávamos fazendo isso há um ano de outras maneiras e em outros filmes. Estrada para Ythaca foi um daqueles raros momentos na vida onde tudo aconteceu de um jeito muito espontâneo e ao mesmo tempo muito claro, foi um daqueles momentos também onde a gente não sabia se o cinema era maior que a vida ou se a vida era maior que o cinema (e não saber isso é muitas vezes libertador).

 

 

b)    Onde entra o Ceará nos projetos de vcs e de que maneira o conceito do Alumbramento forma uma coletividade fílmica?

 

Ceará é o lugar onde foi possível construir a Alumbramento e fazer arte espontaneamente e fora de uma lógica de mercado. Ceará é também o lugar onde fizemos os nossos filmes e vamos continuar fazendo (mesmo filmando em outros lugares do Brasil). 

Um dos momentos mais intensos na história do Alumbramento foi em 2007/2008 quando concebemos e realizamos Praia do Futuro, um filme composto por 15 episódios e feito por 18 realizadores que são pessoas envolvidas não só com cinema, mas também com artes visuais, moda, poesia, música, dança, teatro e design. Na época muitos de nós nos reuníamos na sede do Alumbramento para assistir aos episódios e opinarmos, debatermos e conversarmos. Muitos filmes foram modificados nesse processo. Além disso as funções se intercambiavam de um filme pro outro. Se em um você fazia figurino, no outro você atuava, se em outro você fazia som, no seguinte ajudava a montar, e assim por diante em inúmeras combinações. Até hoje esse foi o nosso maior esforço coletivo. O resultado são filmes assumidamente experimentais, de uma beleza crua e uma poesia desnorteante.

No contexto atual esse tipo de empreitada não tem como acontecer. Muitas coisas mudaram, como por exemplo, boa parte do grupo que formava a Alumbramento no começo não mora em Fortaleza no momento. Tudo na vida vai ficando mais difícil e as escolhas (como fazer cinema com liberdade e conseguir se sustentar, com quem fazer cinema, como fazer a produtora funcionar, etc.) tem que ser tomadas com consciência e responsabilidade. Isso faz com que cada um encontre o seu caminho e aí o trabalho mais difícil é fazer com que os caminhos continuem se cruzando. A coletividade tem que ser trabalhada diariamente. É o que fazemos nos nossos filmes. E o cinema é uma arte coletiva. Quando decidimos fazer isso para nossas vidas, era uma das opções mais radicais que um jovem podia tomar na vida. e a alumbramento nasce do encontro de vários jovens que tomaram essa decisão e estavam dispostos a passar pelo que fosse para estar juntos e criar juntos. Fortaleza ainda é uma cidade muito hostil à arte e ao artista e o processo para que isso mude é tortuoso e demorado. o bom é que tem cada vez mais pessoas trabalhando para que isso mude.

 

 

c)    Que filmes, entre longas, médias e curtas, você já rodaram e quais são os novos planos?

 

Para quem quer conhecer nossa filmografia, pode entrar no site www.alumbramento.com.br. os curtas estão quase todos disponíveis online. assim como os episódios do praia do futuro. Nesse instante o site esta sendo reformulado e atualizado. Agora estamos em processo de finalização de três longas e dois curtas. O Alexandre Veras está terminando o seu longa premiado no último B.O. do Minc, ” que foi produzido pela alumbramento. Ricardo Pretti vai começar a montar com luiz Pretti e Guto Parente o seu longa realizado recentemente dentro do projeto operação sonia silk. Guto Parente está terminando de montar um longa que realizou em fortaleza em parceria com o poeta Uirá dos Reis, chamado “doce amianto”. Pedro Diogenes vai começar a montar com Guto, Luiz e Ricardo seu curta chamado “Retrato de uma paisagem” e Luiz Pretti, Ivo Lopes e Clarissa Campolina estão também finalizando um curta que realizaram juntos chamado “odete”.

 

 

d)    De que maneira a questão da amizade norteia a produção que vocês fazem?

 

A gente já entendeu que a nossa relação funciona assim: trabalhamos juntos porque somos amigo e somos amigos porque trabalhamos juntos. O primeiro filme que a gente fez junto foi uma forma de estabelecer essa relação e isso fez com que a construção dessa amizade entrasse na diegese do filme. De lá pra cá o tema da amizade ronda os filmes que fizemos juntos. É como se o tema fosse primordial (e quase inevitável) no nosso trabalho. Mas enquanto Ythaca foi um filme sobre a invenção de uma grande amizade, Os Monstros foi uma avaliação de como vemos essa amizade em contraponto com uma sociedade utilitarista, sem tempo para a amizade e No lugar Errado é uma subversão da nossa ideia romantizada sobre a amizade e o que fica depois disso (acreditamos que a amizade apesar de tudo é a grande vencedora).